sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Comer sabão e deserto

Ontem passei o dia no Centro Cultural de Belém. Quem me queria ver, teve de ir lá. Enquanto eu por lá andava, não pude deixar de voltar a apreciar o edifício. Apesar de todas as críticas à sua estética, é um edifício muito bonito e interage bem com as pessoas. Este ano reparei muito nas pessoas que por lá andavam. Havia muita gente, portugueses e estrangeiros, estavam bem-dispostos, e alguns ficavam encantados quando os pulverizadores de água se ligavam no átrio principal. A luz a bater na pedra, o céu de um azul lindíssimo, rasgos de nuvens brancas--tudo isso me fez muito feliz.

Duas das pessoas que se encontraram comigo relembraram que o orçamento da construção do CCB foi atropelado por um ou dois camiões TIR e aquilo custou muito mais do que o que devia. A esse respeito tenho duas considerações a fazer. A primeira é que eu desconheço um orçamento em Portugal que tenha sido cumprido ou tenha sofrido de um enviesamento a favor dos contribuintes portugueses. Não querendo parecer eu o Bill Maher, que é um bocadito feio, apesar de muito divertido, gostaria de propor uma "nova regra": calcule-se o factor de enviesamento dos orçamentos portugueses e corrija-se futuros orçamentos com esse factor para que os orçamentos deixem de ter previsões enviesadas. Quando se sabe que as previsões são enviesadas, só por parvoíce é que continuamos a acreditar nelas.

A segunda consideração é que, no grande esquema das coisas, se todos os projectos públicos tivessem o uso que tem o CCB, os contribuintes portugueses poderiam considerar-se muito felizes. O projecto foi caro, mas as pessoas usam aquilo. Já outros projectos que por aí andam foram caros e ninguém os usa--quer dizer, eu até usei umas auto-estradas que estavam completamente vazias, mas vou dizer-vos um segredo: a minha utilidade de usar as ditas estava muito abaixo do custo das mesmas per capita e, então, do custo por utilizador, nem se fala... Eu sei que Portugal gosta de nós, mas não era preciso ter tanto trabalho e gastar tanto dinheiro para construir umas autoestradas que apenas meia dúzia de gatos pingados tem o prazer de usar. Idem para outras obras públicas de benefício duvidoso. Há, no entanto, uma solução: aumentar o número de utilizadores para, assim, aumentar os benefícios e absorver os custos. "It ain't rocket science", como se diz na América!

No terceiro piso do CCB, há um café que tem um terraço. Pensei em ir lá, mas não consegui. Quando li o menu deles ri-me tanto, tanto, que até chorei. O meu amigo F., que me telefonava a dizer que já tinha chegado, apanhou-me a meio do meu ataque de riso e pensou que eu tinha enlouquecido. Não fui eu que enlouqueci, foi alguém que na versão inglesa do menu meteu sabão e deserto em vez de sopa e sobremesa. É pena que não haja água no deserto. Assim não dá para fazer muitas bolhas com o sabão. Ou será que usamos cuspo?..

4 comentários:

  1. Espero que não tenha desistido de vez de ir ao Bar Terraço. É dos sítios mais agradáveis de Lisboa, e não se come nada mal. Muita gente não conhece, mas há estudantes que lá fazem com certeza o curso inteiro e pessoas que, a avaliar pela familiaridade com o senhor do bar, fazem do sítio escritório. Há uns anos atrás havia todos os dias música ao vivo (instalada no andar de baixo ouvia-se pelo poço interior), de graça, das 7 às 9 da noite. Foi uma pena ter acabado, mas durante muito tempo todos os meus encontros eram dados lá.

    ResponderEliminar
  2. Há uns anos um restaurante de Tomar tinha "sleeve" na lista de sobremesas. Bem mais difícil de compreender do que soap ou desert ;-)

    ResponderEliminar
  3. "A primeira é que eu desconheço um orçamento em Portugal que tenha sido cumprido ou tenha sofrido de um enviesamento a favor dos contribuintes portugueses."
    A Ponte 25 de Abril, antes Salazar, além de ter sido construída dentro do prazo (antecipou-o até) cumpriu o orçamento...

    ResponderEliminar

Não são permitidos comentários anónimos.