segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Solução para o desemprego

Este fim-de-semana, ao ouvir o Bellevue, dos GNR, finalmente me dei conta que, em 1986, o genial Rui Reininho sugeriu uma solução muito eficaz para diminuir o desemprego. Talvez algum partido a queira explorar na próxima campanha eleitoral.

"Salto para cima experimento o colchão
Onde era sangue é só solidão

Os meus amigos enterrados no jardim
E agora mais ninguém confia em mim

Era só para brincar ao cinema negro
Os corpos no lago eram de gente no desemprego"

Crescimento "robusto"

Quem estuda economia sabe que medir a economia é uma grande chatice. O PIB, uma medida que já vem de 1937, foi proposto por Simon Kuznets e inicialmente foi importante para medir o progresso que se fazia na luta contra a Grande Depressão. O mérito do PIB mais apreciado naquela altura é que descia quando as coisas ficavam más e subia quando elas melhoravam. Hoje em dia a lógica é a inversa, pois nós sabemos que as coisas estão más quando o PIB desce e melhoram quando ele cresce--ou será que melhoram? Medir uma economia através do PIB tem muitos defeitos, mas é a métrica mais popular e mais fácil de compreender.

A semana passada saiu a revisão da estimativa para o crescimento da economia americana no segundo trimestre: o crescimento homólogo do PIB foi revisto de 2,3% para 3,7%. A Bloomberg teve logo uma peça em que se aconselhava cuidado com o número do PIB porque o Rendimento Doméstico Bruto apenas aumentou 0,6%. A verdade deve estar entre um número e o outro. Entretanto, em Agosto, os americanos estão um bocadinho deprimidos, pois onível de confiança dos consumidores caiu.

Talvez se recordem que a economia alemã expandiu a 0,4% no segundo semestre, depois de ter expandido a 0,3% no primeiro. A The Economist denota o desempenho robusto da Alemanha, que contribuiu para o maior crescimento da Zona Euro. O governo alemão também está feliz com o resultado. Deus abençoe a Alemanha, que eu não tenho uma bênção aqui à mão. Depois de ler a Bloomberg, fiquei confusa com a definição de "robusto". Das componentes do PIB da Alemanha, as exportações cresceram 2,2%, mas o terceiro parceiro comercial mais importante para a Alemanha é a China. Hmmm, será isto robusto?

Já sei que, de acordo com algumas pessoas, os problemas da China têm a ver com o mercado bolsista, não são reais. Na realidade, construir cidades vazias é uma óptima alocação de recursos. Ter terras agrícolas tão poluídas que os agricultores e os seus filhos têm cancro, mas continuam a comer o arroz porque arroz poluído, que eles sabem que os mata, é melhor do que morrer de fome também é óptimo. Construir escolas que "obedecem" a leis de qualidade de construção civil tão más que elas caem com crianças lá dentro também é bom. E que dizer de usar imobiliário para garantir empréstimos para se "investir" na bolsa? A realidade é aquela coisa que nos morde de vez em quando, não é?

Os gregos continuam a desapontar: não bastava terem sido chamados de uma oddity pelo The Economist, quando se anunciou o seu crescimento de 0,8% no segundo trimestre, como agora o seu crescimento foi revisto em alta para 0,9%. A maior causa deste desempenho foi a descida das importações, que contraíram 4,9%. A Bloomberg diz que os economistas ficaram chocados com estes números e estão a contar com más notícias no terceiro trimestre para o tradicional "I told you so..." No entanto, os números foram cozinhados pela própria Grécia, logo sabe Deus se são confiáveis ou não.

Multiplicação e distribuição

Os homens caçavam juntos, mas na partilha tinham de se separar. Com o reconhecimento dessa partilha, começa a justiça. A sua regulação é a primeira lei. Todos têm direito a comer, mas todos devem contribuir também para obter a comida. 
Quem tem direito ao javali? Quem come as melhores partes? A que parte têm direito as mulheres, as crianças, os velhos? Cada tribo tinha as suas regras. Hoje, como há milhares de anos, há muitas maneiras de regular a partilha do javali. Todavia, socialistas, liberais ou conservadores estão todos de acordo num ponto: para haver distribuição, primeiro tem de haver produção.
A esmagadora maioria das pessoas está ocupada com a produção de bens de todo o tipo. Mas a distribuição correu mal, dizem os socialistas – e o conteúdo do socialismo, de forma simplificada, reduz-se a este argumento.
De qualquer maneira, toda a gente venera a produção. Hoje, aos olhos da maioria das pessoas, a produção assumiu mesmo um carácter sagrado. Donde vem essa veneração? Em que ponto na história da humanidade começa a aprovação da produção? Esse ponto não existe, diz-nos Elias Canetti. Ou melhor, esse ponto remonta tão longe no passado, que qualquer tentativa para o situar historicamente é infrutífera.
No seu “Massa e poder”, Elias Canetti fala nas “matilhas de multiplicação”. A hybris da produção remonta à matilha de multiplicação. O homem sentiu-se, desde sempre, fascinado pelos animais que viviam juntos em grande número. Ao observar os lobos, os cardumes de peixes, os enormes enxames de insectos, o homem aprendeu o sentido da multiplicação. A multiplicação transformou-se num desígnio.
No mundo moderno, graças às máquinas, a multiplicação de bens e pessoas cresceu imensamente. Mas a distribuição continua a ser “o verdadeiro objectivo de todos os movimentos interessados na actividade humana em comum e na existência humana de um modo geral.”

Submissão

“Quando os meses sagrados tiverem passado, matai os infiéis onde os encontrardes; capturai-os, acossai-os e postai-vos em cada emboscada contra eles.” Para Canetti, o Alcorão, o livro do Profeta que Deus inspirou, não deixa dúvidas: Maomé “é o profeta do combate e da guerra”. Aos combatentes do islão compete não tanto converter, mas, acima de tudo, submeter os infiéis. Não por acaso “islão” significa submissão.

Desprezo

“Esmago-te na palma da mão”. Segundo Elias Canetti, este é o maior desprezo que se pode exprimir por alguém. É uma forma aproximada de dizer: “És um insecto. Nada significas para mim. Posso fazer de ti o que quero e, mesmo depois, também não significas nada para mim. Não significas nada para ninguém. É possível esmagar-te impunemente. Ninguém daria por isso. Ninguém o ficaria a saber. Eu também não.”

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Tempo de ninguém...

Hoje senti vontade de ouvir "Space Oddity", a canção do David Bowie, mas cantada pela Natalie Merchant. A voz dela, a tal que até nos poderia dar prazer cantando a lista telefónica, tem um significado muito pessoal para mim. Depois há a letra da canção, começando pelo título: "space oddity". É assim que eu me sinto tantas vezes. É assim que, por alguns momentos, eu me senti hoje.

O vosso hoje é ontem para mim--é o tempo de ninguém...

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Olhos em bico!

Não sei o que pensar sobre os motivos da China para intervir no mercado bolsista chinês. Diz a Bloomberg hoje:
Authorities want to stabilize equities before a Sept. 3 military parade celebrating the 70th anniversary of the World War II victory over Japan, said two of the people, who asked not to be identified because the move wasn’t publicly announced. Treasury sales allow policy makers to raise dollars needed to bolster the yuan after a shock devaluation two weeks ago, according to different people familiar with the matter.

Este pessoal que controla a vida de milhões -- OK, mais de mil milhões -- de almas parece-me muito criativo. Que fazer senão um short no mercado chinês para 4 de Setembro?

Estranho amor

A vida glamorosa do Turista Lusitano continua. Ontem, fomos ao Miller Outdoor Theater, um teatro ao ar livre que faz parte do Hermann Park, que é o parque onde se situa o Zoo de Houston, o Planetário, o Jardim Japonês, o Museu de Ciências Naturais, etc.

Os espectáculos deste teatro são grátis para quem se quer sentar na relva. Quem prefere o conforto de uma cadeira, tem de pagar e comprar os bilhetes com antecedência. Como eu só descobri a existência deste teatro ontem através de um anúncio na KUHA, a rádio que pertence ao sistema da NPR (National Public Radio), só dava mesmo para desfrutar o espectáculo na relva. Vimos o filme Dr. Strangelove or: How I Learned to Stop Worrying and Love the Bomb de Stanley Kubrick.

Levámos um cobertor de piquenique, duas almofadas, e farnel. Acabámos por não tocar no farnel. Para mim, que já vivo nos EUA há muito tempo, é sempre interessante ver as coisas que quem vem de fora dos EUA nota. O Turista Lusitano achou estranho que eu levasse tanta coisa, mas depois quando viu as outras pessoas com cadeiras de praia, cobertores, malas térmicas, etc. achou que eu não tinha exagerado. Durante o espectáculo, o Turista Lusitano também achou engraçado que os americanos se descalçassem e se pusessem à vontade.

Eu também notei isso quando vim para os EUA. Há 20 anos, o que estava na moda era sandálias Birkenstock -- agora também está na moda, mas vocês sabem quem não as irá comprar e porquê -- e depois chinelos de enfiar o dedo (1999). Também é comum ver pessoas descalças a caminhar pelos campus das universidades. Coisas que nós, portugueses, fazemos na praia ou na piscina, os americanos fazem-nas nos sítios mais comuns. Até se vê avisos em restaurantes e bombas de gasolina que dizem "No shoes, no shirt, no service."

A lua à espreita atrás do anfiteatro

Tudo preparado para o filme

A área do bar iluminada durante o filme

O fim da noite

Cientistas a sério

Estou a ler um post no ExtremeTech acerca de energia negra (dark energy). Segundo o autor, que não tem formação em física, apenas é formado em biologia molecular, nenhum cientista sabe exactamente o que é energia negra, nem como funciona, e a certeza da sua existência é talvez de 99,996%. A certa altura do artigo, diz-se isto:

You’ll notice that there is a lot of speculation in this field, and a lot of wishful thinking. How do we know that dark energy isn’t another of Einstein’s cosmological constants, a fictional concept invented to shore up a failing theory? Why couldn’t dark energy be just another foolhardy attempt to explain away inconvenient observations?

Imediatamente pensei no que dizem acerca dos economistas e da economia não ser uma ciência a sério porque as ciências duras é que têm todas as ferramentas bem identificadas e o progresso no conhecimento é feito com confiança. Agora alguns de vocês irão dizer que o problema é que quem escreveu o post não é físico (muitas pessoas que escrevem sobre economia não são economistas).

Eu gosto muito do Brian Greene, que é especialista em Teoria dos Cordéis (String Theory). Às vezes tenho pena dele pois até me parece que ele anda com o cordel ao pescoço por causa dos resultados do acelerador de partículas. Ouvindo-se o Brian Greene, nesta entrevista de 2011, também se fica com a mesma impressão do post...

Não posso deixar de pensar que esta malta de física até parece a malta de economia: não sabe nada. E parece que até o Einstein se enganou!

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Da Serra da Estrela à Terra da Estrela (VIII)

Já aqui se dera conta do cartaz, à entrada da pequena cidade texana de Kemah, publicitando o entretenimento para essa noite: luta livre de anões. No estado do Louisiana, a cidade de Lake Charles anuncia orgulhosamente num outdoor: "Exposição de armas - Centro Cívico". Ao cruzar a fronteira do Texas para o Lousiana, um painel luminoso avisa: "Calcasieu Parish: Veio aqui praticar crimes? Não se sinta à vontade." Mas se veio para exibir armas ou andar à porrada com anões, welcome, so nice to see you tonight.

Tex Mix (IV)

Um tipo que tem muito tempo livre, e o usa a inventar palavras, é um vagabulário.

Tex Mix (III)

Para que as crianças possam aprender a ler cada vez mais cedo, urge inventar o abercedário.

Tex Mix (II)

Tinha pensamento crítico e um temperamento cínico. Era um gajo cítrico.

Tex Mix (I)

Em Portugal, ouve-se o ranger de dentes. Aqui, sente-se o ranger do Texas.

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Período inovador

Na Forbes, fala-se de uma inovação para as mulheres: calcinhas absorventes para serem usadas quando a mulher está com o período, não sendo necessário o uso de pensos ou tampões. No artigo diz-se o seguinte:
“Tampons were invented in 1931 and aside from adhesive strips and wings on pads, there hasn’t been any major innovation in 85 years,” says Agrawal. “It’s time to change that — and to change the taboo.”

Realmente, 85 anos é muito tempo. Estas calcinhas têm uma estratégia de marketing semelhante à dos sapatos Toms: ao comprar um item, a companhia compromete-se a doar um outro nos países pobres (a Toms também tem outras actividades de beneficência).

Em África, estar com o período é uma das principais razões pelas quais as raparigas faltam às aulas; logo, se este produto tiver sucesso, isto pode ser bastante importante para o desenvolvimento do continente.

Mundo endividado...

Hoje, no programa da Diane Rehm está a realizar-se uma discussão engraçada sobre a actual crise da China e o seu impacto nos EUA. No programa alguém disse que o nível de dívida mundial é de $300 mil biliões de dólares (nos EUA dir-se-ia $300 triliões porque os americanos usam a escala curta), enquanto que o PIB mundial é de apenas $75 mil biliões. Para algumas pessoas, isto parece assustador, mas não é necessariamente, pois o mundo, ao contrário de países individuais, é um sistema fechado e as dívidas de uns são os créditos de outros--a dívida mundial é cancelada exactamente pelos créditos de quem emprestou.

A dívida ao nível mundial não tem um efeito negativo no mundo como pode ter a dívida nacional para um país. O que tem é um efeito redistributivo de riqueza, pois parte do rendimento futuro dos países devedores vai ser usado para pagar o custo de contrair a dívida, i.e., os juros. Esses juros serão contabilizados como rendimentos dos países credores. Para o mundo, saiu de um bolso e entrou no outro, logo do ponto de vista contabilístico fica-se na mesma.

Como se observou no programa, é mais relevante saber o que essa dívida compra e eu acrescentaria a saúde financeira de quem a contrai. O que a dívida compra informa-nos acerca da criação de riqueza na economia. Por exemplo, na China há dívida que é contraída para construir edifícios que ninguém usa, logo esse investimento não gera um retorno para a economia (em Portugal também há esta ideia que autoestradas e edifícios vazios geram riqueza ao ser construídos). O que é gerado é uma antecipação de rendimento futuro--isto é, tira-se rendimento do futuro para ser gasto no presente. No futuro teremos menos dinheiro porque parte do nosso rendimento é usado para saldar a dívida.

Outra forma de endividamento chinês é contrair dívida para comprar acções no mercado bolsista. Note-se que as empresas que estão cotadas na bolsa chinesa não têm o hábito de dizer a verdade nos relatórios de desempenho (a avaliar pelo BES, em Portugal também há esse problema). Muitas das empresas chinesas valem menos do que elas dizem. Há ainda a agravante de alguns dos empréstimos chineses que foram usados para insuflar o mercado bolseiro terem como garantias activos de imobiliário chinês, cujo valor é duvidoso.

Nós sabemos que o mercado imobiliário chinês é uma bolha, só não sabemos o seu tamanho nem quando irá estalar. Há quem diga que é desta que a coisa rebenta, mas um dos comentadores no Diane Rehm Show disse uma coisa que faz muito sentido: a China controla a saída de dinheiro, logo a maior parte das pessoas não consegue tirar o dinheiro da China, logo tem de o investir nacionalmente: ou investe na bolsa ou em imobiliário. Se o mercado bolsista está em sarilhos, as pessoas provavelmente irão tirar dinheiro da bolsa e metê-lo noutro sítio, i.e., em imobiliário.

A crise actual tem o potencial de insuflar o mercado imobiliário chinês ainda mais no curto prazo, fazendo com que o estalo da bolha imobiliária chinesa seja muito maior no longo prazo.

Road kill

No Domingo à tarde, o Turista Lusitano e eu regressámos de Nova Orleães, mas como o Turista Lusitano queria ver pobreza na América saímos das auto-estradas inter-estaduais e andámos pelas estradas estatais e locais da Luisiana. A certa altura, já de noite, apareceu-me um bicho pela frente numa dessas ruas e eu portei-me à altura: dei um grito, disse asneiras, e travei a tempo de evitar atropelar a criatura--era um gambá. Na minha cabeça, para além do rol de "fuck, fuck, fuck...", também passava a canção do genérico do True Blood porque algumas das cenas que nós víamos eram iguais às desse genérico.

Depois passei para a imagem mental seguinte: "road kill". Perguntei ao Turista Lusitano se ele sabia o que era "road kill". Não sabia. Expliquei-lhe que era a bicharada que era atropelada na estrada e que havia muito boa gente que aproveitava os cadáveres dos bichos para cozinhar. Pensam que eu brinco? Não, não, falo a sério. Ora vejam lá na Wikipédia um artigo sobre "road kill cuisine".

Na minha hospedaria, os turistas descobrem a verdadeira América...

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

A exigência é só para um dos lados?

Um destes dias, António Costa explicou que não promete empregos. Apenas se compromete com medidas que estima que terão um determinado impacto sobre os números do emprego. Eu percebo que esta mensagem seja difícil de passar e é normal que quem se opõe ao PS se aproveite da aparente contradição para acusar Costa de dar uma no cravo e outra na ferradura.

Mas, na verdade, mesmo que a distinção seja intricada, ela está correcta. E se nós, muitas vezes, nos queixamos da falta de exigência dos eleitores para com os políticos, não faz sentido criticar António Costa. Se os eleitores não entendem, então faz-se a pedagogia que for necessária. O grau de exigência para com os eleitores também tem de aumentar.

domingo, 23 de agosto de 2015

Dualismo e reforma do mercado de trabalho: uma proposta para Portugal

O meu contributo para o debate, no Expresso de sábado.

A exigência de “reformas estruturais” do mercado de trabalho é um requisito proposto pela generalidade das instituições internacionais, e um dos elementos de maior relevância nos programas de resgate financeiro dirigidos aos países sob assistência. No entanto, as medidas com maior peso nas reformas propostas são as dirigidas à promoção da moderação salarial, nomeadamente no que diz respeito à rigidez nominal dos salários, através da diminuição do alcance dos instrumentos de contratação colectiva, aumento das horas de trabalho, bem como através da redução das indemnizações por despedimento, a qual facilita o ajustamento salarial pela substituição dos contratos mais antigos por contratações com níveis salariais inferiores.
Estas reformas, cujo pouco conteúdo que pouco difere de país para país, esquecem um dos maiores problemas identificados nas economias do Sul da Europa: o dualismo do mercado de trabalho, evidenciado com maior severidade em Espanha, Portugal e Itália. Este dualismo caracteriza-se pela coexistência de dois mercados de mercado paralelos: um mercado fortemente protegido dos choques económicos adversos, constituído por trabalhadores com contratos sem termo, e um mercado de trabalho de trabalhadores com contratos a prazo, onde todos os riscos estão concentrados. A existência deste dualismo deve-se a um conjunto de políticas destinadas a flexibilizar as relações laborais que tiveram lugar ao longo das décadas de 80 e 90, tendo contribuído para uma significativa diminuição do desemprego naqueles países verificada entre 1995 e 2007. 
Num período longo de crise ou estagnação económica, a segmentação do mercado resultou num aumento acelerado e significativo do desemprego na parte não protegida do mercado de trabalho, traduzido em taxas de desemprego jovem acima dos 30%. Adicionalmente, o dualismo do mercado de trabalho afeta de forma relevante o potencial de crescimento da economia, seja por um menor investimento em capital humano (relações laborais de curto prazo não incentivam o investimento em formação profissional, quer por parte dos empregadores, quer por parte dos trabalhadores), seja por efeitos negativos de longo prazo do desemprego jovem no tipo e qualidade de ocupações que os jovens poderão desempenhar no futuro.
Sendo de esperar que a recuperação do mercado de trabalho se consolide a curto e a médio prazo, seria importante que esta recuperação fosse acompanhada por um conjunto de reformas que combatam de forma mais pronunciada a segmentação do mercado de trabalho. Estas reformas deveriam contemplar a criação de um novo tipo de contrato a tempo indeterminado que preserve a flexibilidade de contratação ao nível da empresa e ofereça uma perspetiva de relação laboral de longo prazo para os mais jovens. Este novo tipo de contrato deveria assim conter alguns dos elementos de flexibilidade existente na contratação a prazo, que fazem com que seja a forma preferida atual de contratação para as empresas, e elementos de segurança do emprego, que a tornem atrativa para os trabalhadores. 
A recente lei italiana, de março de 2015, do “Contrato a Tutele Crescenti”, contém alguns dos elementos anteriormente descritos: trata-se de um novo tipo de contrato de trabalho que se aplica a novas contratações, que na prática permite o despedimento por motivos económicos não justificados, através do pagamento de uma indemnização igual a dois meses de salário por ano de antiguidade na empresa, com um mínimo de quatro e um máximo de vinte e quatro meses. Espera-se assim diminuir os custos associados a processos judiciais de despedimentos injustificados, diminuindo a incerteza e o risco que o empregador incorre no momento da contratação. Por outro lado, aumenta-se a segurança no emprego face a um contrato a prazo, através da indemnização crescente com a antiguidade. 
Apesar de ainda ser prematuro uma avaliação dos impactos desta reforma na diminuição do dualismo no mercado de trabalho italiano, seria muito oportuno iniciar o debate sobre o lançamento de um novo tipo de contrato de trabalho, com características semelhantes, em Portugal. Este novo tipo de contrato de trabalho poderia, na prática, traduzir-se na possibilidade do despedimento individual ser fundamentado com as mesmas regras do despedimento coletivo (note-se que em Portugal é mais fácil proceder ao despedimento de cinco trabalhadores do que de um trabalhador), acompanhado por uma compensação superior à existente atualmente para os contratos sem termo (doze dias por cada ano de antiguidade, com limite até doze anos), por exemplo de dois meses por cada ano de serviço. O debate sobre as condições de funcionamento do mercado de trabalho nunca é um debate fechado. A situação atual assim o demonstra e o exige. 

Y'all come back and see us...

Ontem, à saída de um restaurante no French Quarter, fomos despedidos assim por um empregado, que insistia em manter uma cara séria:
--You're leaving us already? We're about to close the doors and hold everyone hostage inside. Thank y'all for coming and come back and see us sometime...

sábado, 22 de agosto de 2015

Anúncios de risco: precisam-se

A Sandra Maximiano põe pouco os pés por estas bandas, por isso temos de procurá-la no Expresso. No seu artigo de ontem por lá, reflecte, a propósito do anúncio da Joana Amaral Dias, sobre a gravidez como justificação para o papel secundário da mulher no mercado de trabalho. Diz ela que a desigualdade de género decorre da maternidade. E eu concordo, mas por motivos diferentes.

Para a Sandra, a divisão sexual do trabalho, que atribui à mulher as tarefas domésticas (quiçá, por oposição a selvagens) e deixa para o homem a responsabilidade de prover sustento, decorre de se considerar a mulher portadora das características óptimas para a função de cuidadora e de uma vocação natural para esse papel. Para mim, resulta da ausência de testes de ADN, cuja invenção permitiu que a paternidade deixasse de ser questão de fé.

Mas indo ao ponto que eu julgo ser o da Sandra. Percebo o seu ponto e subscrevo que haverá quem use o caso de Joana Amaral Dias como argumento de que as mulheres não podem reclamar igualdade de direitos e oportunidades pelo facto de terem um útero. E isso independentemente de aqui se tratar de uma gravidez de risco, o que a coloca no patamar das doenças. No entanto, acho que é precisamente esse pensamento enviesado que torna o anúncio mais necessário. Uma vez disseram-me que o mundo é um lugar injusto e que temos é de aprender a viver nele. Discordo totalmente. Quem repudia preconceitos e desigualdades nunca poderá aprender a (con)viver com a injustiça. E mais anúncios arriscados são precisos para fazer do mundo um sítio melhor.

DdD na Crescent City

É verdade, estamos em Nova Orleães, na Louisiana. Ontem caminhámos pelo Quarteirão Francês e pela rua mais famosa destas paragens: Bourbon St. Aqui vão umas fotos de ontem. Observações e vídeos da viagem ficarão para mais tarde. 


















"Os abusos no fisco não acontecem por acaso"

Quando comecei no blogue, há 10 anos, admirei-me com a quantidade de artigos de opinião e de editoriais que copiavam ideias e argumentos meus. Às vezes, subtilmente; outras vezes, plágios descarados.

Depois habituei-me e até passei a ver isso com bonomia, afinal era uma forma de os meus argumentos terem um alcance maior.

Ler um artigo destes, e a forma como os créditos argumentativos são distribuídos, mostra como se evoluiu. E mostra como, ao contrário do que muitos dizem, a qualidade da opinião publicada, pelo menos alguma, melhorou substancialmente.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Furacão Danny

O primeiro furacão desta temporada chama-se Danny e encontra-se a 1,754 Km das Ilhas Windward, no Oceano Atlântico. Para a semana teremos uma melhor ideia do que Danny nos reserva. É sempre excitante acompanhar o percurso de um furacão. É pena que causem tanta destruição e perda de vida porque são fenómenos muito interessantes.

Aqui está o primeiro retrato de Danny, fornecido pelo Environmental Visualization Laboratory, da NOAA. A página deles é uma das minhas páginas preferidas da WWW. Lá encontram imagens de satélite muito giras. Não deixem de as mostrar aos vossos filhotes.

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Como a direcção do DN cauciona uma sacanice

A entrada anterior da Rita Carreira, a respeito da vergonhosa ‘Nota de Direção’ do DN (seguir este link e ler a nota final), é certeiríssima, em especial, quando pergunta:


Mas, ainda assim, é branda. A notícia original é uma sacanice. O jornalista põe entre aspas uma citação corrompida, objectivamente, inventando um facto. Em cima dessa invenção, descontextualizou a falsa citação. De seguida, com base no facto forjado e na descontextualização feita, constrói toda uma notícia cheia de insinuações. E depois, quando desmentido, a direcção do jornal tem a lata de escrever uma ‘Nota de Direção’ onde não lamenta o erro e não pede desculpas nem aos leitores nem ao visado. Pior ainda, culpa a vítima por se ter recusado a prestar declarações sobre um processo que está em julgamento. Canalhice nem perto chega de descrever a forma de actuar do DN neste caso.

E, claro, no fim, fica a pergunta, se um jornalista corrompe um testemunho oficial, que é de livre acesso, ao Ministério Público, que confiança pode alguém ter para lhe prestar informações ao telefone?

André Azevedo Alves vê neste episódio apenas um sintoma de que o jornal está reduzido a “um órgão de propaganda, ainda por cima mal feito, quase sempre mal escrito e sem qualquer respeito pelos leitores nem pelos visados nas 'notícias' que vai publicando”. Permito-me discordar desta apreciação geral, pelo menos para já. O jornal tem jornalistas que prezo. Por exemplo, disse-me o Fernando, as notícias publicadas sobre assuntos relacionados assinadas por Valentina Marcelino são peças informativas e bem informadas.

Sou daqueles que consideram que a qualidade dos serviços se mede pela capacidade de se corrigir quando as coisas correm mal. Esta ‘Nota de Direção’ demonstra que o director do jornal, André Macedo, cauciona esta forma de actuar. A direcção  do DN finge que não percebe que há um dever de reserva e que não é razoável que um ex-Secretário de Estado ande a responder pelos jornais ao advogado de um antigo subordinado seu que está acusado de 80 crimes. 

Naturalmente, enquanto a direcção do DN se mantiver, nem mais um cêntimo meu vão ver. Já mandei um e-mail a cancelar a minha assinatura.

I'm sexy and I know it

Cá para mim, isto de o Tsipras se demitir é uma consequência do ranking de sexyness saído a semana passada, que o colocava à frente do Obama. O homem aspira a top model.

DN e filosofia de jornalismo

Ontem li a resposta do Fernando Alexandre ao artigo que erradamente o citava. Ao fundo da resposta, li a Nota de direcção publicada pelo Diário de Notícias (DN). Não percebi muito bem a posição do DN, nem a filosofia de jornalismo que o jornal segue. Diz a Nota de Direcção:

Nota de direção: O DN procurou ouvir Fernando Alexandre antes de publicar a notícia. Mas este recusou responder em on. As suas respostas teriam evitado o erro quanto à troca da palavra assinalada no presente direito de resposta que teria reduzido a abrangência da notícia, embora - cremos - sem alterar o seu significado, isto é, a aparente contradição entre o depoimento prestado ao MP e os documentos (e-mails) que o mesmo recebeu e que constam do processo.

No DN não falseamos histórias, nem as deturpamos. Pelo menos consciente e voluntariamente. O conhecimento de Fernando Alexandre do processo podia ajudar quanto à verdade dos factos. Durante a última semana, o DN procurou encontrar uma maneira de aprofundar o assunto de modo a clarificar o tema. Não foi possível. Fernando Alexandre não quis responder, apesar de até lhe ter sido proposto que respondesse, por escrito, às questões do DN, o que lamentamos.

Não sou jornalista, mas casei com um jornalista americano e pude observar a forma como os jornais operam nos EUA. Quando o meu marido era "night editor" de um jornal, a última pessoa a ler o jornal antes de este ser impresso, ouvi frequentemente as suas queixas de quando os jornalistas introduziam erros nas histórias e os "copy editors" não eram cuidadosos na verificação do trabalho do jornalista, abrindo as portas ao risco de o jornal ser processado.

Diz o DN que a responsabilidade pelos erros da história é do Fernando Alexandre e da sua decisão de não responder às perguntas do jornal. Quando li isto, fiquei perturbada. A história é baseada num depoimento oficial que existe e ao qual o jornal teve acesso. O erro advém de esse documento ser mal citado por duas formas: desrespeito pelo contexto da citação e transcrição incorrecta da citação. Qualquer pessoa que trabalha no jornal poderia ter corrigido este erro sem precisar de acesso ao Fernando Alexandre, bastava verificar a fonte original da citação. Isto é factual, não está sujeito a interpretação.

Quando eu leio uma história do DN, exactamente o que é que eu devo pensar? Que o jornal tem carta branca para citar erradamente documentos oficiais, especialmente quando os autores da citação não verificam os factos da história? Que o editor do DN não se sente responsável por evitar erros deste tipo no futuro? Que o DN é um jornal que não tem implementado um processo de controle de qualidade?

Let's go Stros!

Ao fim de 13 innings, quatro horas de jogo, três sliders, e dois hot dogs, ganharam os Astros. Boo-yah!




DdD e os Astros

A Destreza vai ao beisebol... (É baseball, pessoas.)

O campo de estudo. 

Quase a postos para o serviço. 

NAJ a investigar o espécime americano no local. 



quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Diário de Notícias publica direito de resposta

O Diário de Notícias publica hoje o meu direito de resposta à caluniosa 'notícia' da autoria de Carlos Rodrigues Lima. Como mostro, para além do jornalista demonstrar desconhecer o meu depoimento ao Ministério Público (que terá sido a base da sua 'notícia'), toda a sua argumentação assenta na deturpação duma passagem do meu depoimento, a qual cito ipsis verbis.
Aproveito para agradecer a todos o apoio neste processo e deixo-vos aqui a minha resposta:

O Diário de Notícias publicou, no dia 7 de agosto próximo passado, uma "notícia" baseada no meu depoimento ao Ministério Público no âmbito do processo que envolve, na qualidade de arguido, o ex-Diretor Geral de Infraestruturas e Equipamentos do Ministério da Administração Interna (ex- DG), João Correia.
O jornalista Carlos Rodrigues Lima (CRL) falseou o depoimento do signatário ao Ministério Público (MP).
O jornalista CRL insinua que o signatário, na altura membro do Governo de Portugal, teria mentido ao MP. De acordo com CRL, no depoimento ao MP, afirmei que João Correia "não me informava sobre obras". No entanto, novamente de acordo com CRL, há "emails que contradizem versão do ex-Secretário de Estado do MAI" (citações do título e subtítulo da "notícia").
Em direito de resposta, protesto que se trata de uma caluniosa insinuação que é, evidentemente, falsa.
Em parte alguma do meu depoimento perante o magistrado do MP, referi que o ex-DG não me "informava sobre obras". De facto, eram frequentes as reuniões com o ex- DG, convocadas por mim, bem como a troca de emails em que o tema eram as instalações do MAI, incluindo obras a realizar.
O que tornei claro no depoimento ao MP é que nem discutia matérias nem recebia informações relacionadas com os processos de contratação, adjudicação ou projetos de arquitetura ou outras matérias delegadas no ex-DG (ou outras, como as que estão na origem da acusação do MP).
A falsa acusação que CRL me dirige assenta numa deturpação grosseira do meu depoimento, onde consta o seguinte:
"Quando iniciou o seu mandato, a extinção dos Governos Civis já tinha ocorrido e a reafetação das respetivas instalações (em número de 18) a forças e serviços do MAI já tinha sido concretizada.
Por essa razão e também, como referiu, devido à própria autonomia da DGIE, não acompanhou tal processo, nunca lhe tendo sido apresentado um processo de adjudicação ou um projeto de arquitetura ou outra peça referente à realização e adjudicação de obras de reafetação. Todas as decisões foram tomadas pelo Prof. João Correia, que não forneceu à Secretaria de Estado quaisquer informações sobre o estado desses processos".
Para sustentar a acusação que me dirige, CRL mente ao referir que o signatário transmitiu ao MP que o ex-DG "não me informava sobre obras". Escreve CRL: «Apesar de ter garantido ao Ministério Público que o seu diretor-geral "não fornecia à Secretaria de Estado quaisquer informações sobre o estado dos processos", um conjunto de emails revelam que o ex-secretário de Estado da Administração Interna, Fernando Alexandre, esteve a par das obras realizadas pela Direção-Geral de infraestruturas e Equipamentos».
É fácil de verificar que a acusação que o jornalista CRL me dirige assenta em duas graves adulterações do meu depoimento ao MP. Primeira, toda a "notícia" baseia-se na descontextualização da citação do meu depoimento, que se referia a aspetos específicos (como sejam processos de adjudicação ou projetos de arquitetura), de obras específicas, anteriores à minha tomada de posse e não a todas as obras. Segunda, naquela citação, o jornalista alterou um determinante do meu depoimento, deturpando-o.
CRL citou-me como eu tendo transmitido ao MP que João Correia "não fornecia à Secretaria de Estado quaisquer informações sobre o estado dos processos", quando a citação correta era "sobre o estado desses processos" (destaques meus).
Com esta deturpação do meu depoimento ao MP, CRL pôs em causa a minha honra e dignidade pessoal, bem como a minha dignidade profissional e dos elementos do meu gabinete.
Estivemos em funções entre 22 de abril de 2013 e 22 abril de 2015. Logo em 30 de janeiro de 2014, reduzi as competências do arquiteto João Correia ao mínimo previsto na lei, tendo-o exonerado no dia 11 de fevereiro de 2014. João Correia viria a ser detido cerca de três meses mais tarde, em 29 abril de 2014, tendo sido acusado de cerca de 80 crimes, a maioria dos quais anteriores ao início do meu mandato como Secretário de Estado. Neste processo, são também arguidos dois ex-dirigentes intermédios daquela DG (incluindo a responsável pela contratação de empreitadas), empresários de construção civil e arquitetos.
A investigação do MP, que culminou na referida acusação, teve na sua origem denúncias de suspeitas de prática de atos ilícitos que terão sido praticados por João Correia, as quais foram transmitidas às entidades competentes imediatamente após terem chegado ao conhecimento do meu gabinete.

Da Serra da Estrela à Terra da Estrela (VII)

O trânsito nas estradas do Tio Sam é parecido com a política no partido do Avô Soares. Cada um escolhe a faixa que quer e ultrapassa por onde pode, indistintamente pela direita ou pela esquerda.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

"Marcação"

Ontem, quando abri a página da Yahoo, apareceu uma rapariga, que me parece ser "importante". É uma actriz americana, a Shay Mitchell de quem eu nunca tinha ouvido falar; aliás, eu nem sequer tinha ouvido falar na série que ela faz, uma coisa chamada "Pretty Little Liars". Como eu deixei de ver TV depois da quarta temporada do True Blood, estou completamente desactualizada.

Tem 28 anos e aspirações de se tornar numa Gwyneth Paltrow. Digo isto porque, há uns anos, a Gwyn teve a ideia de criar uma página de "estilo de vida" chamada Goop. Era uma coisa tipo "Martha Stewart Living" para o século XXI. Hoje em dia, páginas à la Goop são mais abundantes do que cogumelos na relva depois de uma chuvinha de Outono.

A página da Shay Mitchell, que ela criou com uma outra pessoa que eu também não conheço, chama-se "Amore & Vita". Como sou curiosa, fui ver do que se tratava. O design pareceu-me estar muito ao corrente das últimas vagas estilísticas. Pergunto-me muitas vezes qual é o estilo que vai estar na moda a seguir a este...

Num dos posts lá do sítio, encontrei um artigo com "18 Dicas do Richard Branson para o Sucesso". Decidi ler. Eu até tenho o livro dele lá em casa porque um antigo aluno meu emigrou para a Austrália e decidiu que eu era a pessoa ideal a quem oferecer a sua mini-biblioteca, que está repleta de livros sobre sucesso e faria inveja ao Donald Trump. Foi assim que eu descobri que havia um tipo chamado Robin Sharma que escreve livros sobre monges e Ferraris. Ainda não me deu vontade de ler Branson, nem Sharma e, por vezes, penso que essa vontade nunca me irá chegar porque prefiro outro tipo de livros.

Ao ler as 18 dicas, houve várias das quais gostei. Deixo aqui a minha preferida, que é sobre gestão de marca, tendo sublinhado a parte da mensagem que eu acho mais importante:

Define your brand.

When it comes to defining your brand, Branson advises entrepreneurs to do the opposite of what he did with Virgin, which is spreading out all over the place. And while it’s true that Virgin branches into many different industries, Branson says the company is actually quite focused on one thing: “finding new ways to help people have a good time.”

Stick to what you know. Underpromise and overdeliver. Because if you don’t define your brand, your competitors will.

Portugal também tem marcas a crescer que nem cogumelos. Há quem diga que é mau serem tantas, mas eu acho que pode ser muito bom. Como a probabilidade de sucesso é muito baixa, é benéfico para o país haver* muitas tentativas para aumentar o número de marcas e empresas que sucedem. No entanto, espero que, a longo prazo, os casos de falhanço se devam mesmo a ineptitude dos investidores e gerentes, em vez de burocracia, excesso de impostos, acesso caro a infraestruturas, energia, e financiamento, legislação inadequada para o país, etc.

* Escrevi "haverem", um dos meus erros mais frequentes, e depois corrigi. Talvez ainda haja esperança que o meu português seja reabilitado e eu pare de misturar gramática inglesa com portuguesa.

Da Serra da Estrela à Terra da Estrela (VI)

Um lusitano sabe que está num universo diferente quando metade dos adultos usam boné e nenhum é treinador do Paços de Ferreira.

Circunlocuções

Há anos, o Nuno Amaral Jerónimo explicou-me, na sua qualidade de sociólogo, que os palavrões só são usados pelas classes altas e baixas. Ao contrário, as classes médias ficam horrorizadas com os ditos cujos. Uma das minhas leituras de verão foi o último romance de Humberto Eco, “Número zero”. Um grupo de jornalistas reúne-se para discutir o formato e conteúdo do número zero de um jornal a ser lançado, o “Amanhã”. Alguém sugere que se inove utilizando palavrões, à semelhança do que fazem as elites italianas, que, pelos vistos, os usam com abundância: «Agora todos usam palavrões … e dizem caralho, inclusive as senhoras.» Porém, o director opôe-se a essa “ideia brilhante”, argumentando que o «que faz a alta sociedade não nos interessa. Nós devemos pensar nos leitores que têm medo dos palavrões. Usar circunlocuções.»

Esta cena passa-se em 1992. Em 2015, os palavrões permanecem interditos nos jornais, que continuam a preferir circunlocuções, circunlóquios, perífrases, rodeio de palavras. Caralho.

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Da Serra da Estrela à Terra da Estrela (V)

Por aqui, deve ser obrigatório os stands de automóveis exibirem muitas e grandes bandeiras com estrelas e listas. Mas a maior de todas pode ver-se no stand da alemã Volkswagen. Se calha Herr Schäuble visitar o Estado da Estrela Solitária, os gregos é que ainda se lixam por tabela.

Da Serra da Estrela à Terra da Estrela (IV)

À entrada da cidade de Kemah, Estado da Estrela Solitária, um ecrã gigante mostra duas senhoras loiras e sorridentes. Por baixo, em língua bárbara, "Parabéns, Miss Kemah e Miss Teen Kemah!" Do outro lado da estrada, um cartaz anuncia: "Entretenimento esta noite: luta livre com anões."
Kemah é a civilização.

Da Serra da Estrela à Terra da Estrela (III)

Estado da Estrela Solitária, 9 da manhã.
(Neste lado do mundo o dia não tem 24 horas, tem duas partes - AM e PM - com 12 horas cada.)
O lusitano entra num café para tomar o pequeno-almoço. Pede um bagel tostado barrado com queijo.
O empregado entrega-lhe o bagel, uma embalagem de queijo creme, aponta para uma mesa ao canto da sala e diz: "Tem ali a torradeira e uma faca."
Chegara o lusitano mais cedo e pedir-lhe-iam para amassar a massa do pão.

Da Serra da Estrela à Terra da Estrela (II)

O lusitano prepara-se para viajar para o Estado da Estrela Solitária.
- "Tens treinado o idioma que se fala lá?"
- "Sim, tenho andado a praticar o meu espanhol."

Da Serra da Estrela à Terra da Estrela (I)

O lusitano prepara-se para visitar o Estado da Estrela Solitária.
"Traz-me uma coisa típica de lá," pedem os amigos que ficam nos Hermínios.
"Assim farei," responde o lusitano. "Preferes um cowboy, uma carabina ou uma cadeira eléctrica?"

domingo, 16 de agosto de 2015

Desonestidade intelectual e inteligência

Quando eu era mais jovem, achava que os papas eram intelectualmente muito desonestos. Por um lado, considerava que qualquer pessoa para chegar a papa tinha de ser muito inteligente. Por outro lado, achava que quem era assim tão inteligente não podia acreditar naquilo que para mim eram (e continuam a ser) patacoadas sem sentido: ressurreições, pecados originais, ascenções, virgindade de Maria, aparições em Fátima, etc.
Mais tarde, percebi que qualquer que seja o assunto (ou, pelo menos, numa enorme variedade deles) há sempre alguém muito inteligente que acredita em coisas que, para nós, são completos disparates.

Evidentemente, essas pessoas pensam o mesmo de nós. Isto no caso de, sequer, nos considerarem inteligentes.

sábado, 15 de agosto de 2015

É barato ❤️ Nova Iorque

Eu, procrastinadora, me confesso. Quando uma das assistentes administrativas do meu trabalho soube que eu ia a Portugal, pediu-me para lhe comprar uma t-shirt. Não era preciso ser nada de extravagante, dizia ela, pois muitas da sua colecção são usadas para ela dormir. 

Durante a minha estadia em Portugal, lembrei-me várias vezes, mas não encontrei nada do qual eu gostasse. Por exemplo, havia umas baratinhas em Conímbriga, mas eu não gostei do desenho. Eu queria, em letras grandes, que a t-shirt informasse que vinha de Portugal e que fosse de bom gosto; as de Conímbriga tinham apenas um boneco um bocado infantil. Achei que aquilo não era bem a imagem de Portugal que eu queria dar, mesmo sendo para a cama e barata. Também não vi nenhuma no Berardo nem na Gulbenkian. Podia ter explorado as feiras ao pé das praias que visitei, mas achei que não estava assim tão desesperada--havia sempre o aeroporto, pensava eu. 

Hoje houve o aeroporto de Lisboa, que está a ser transformado numa magnífica ode ao capitalismo. Fiquei tão orgulhosa! Antes de se fazer o controle de passaporte, e depois de se fazer o check-in da mala e de se passar pela segurança, entra-se imediatamente na área de Duty-Free. Não costumava ser assim. Antes, o Dutry-free era uma lojinha separada do corredor por onde circulávamos; agora o corredor de circulação passa pelo meio do Duty-Free. Admirei o engenho capitalista da coisa--a sério que sim!--, mas não vi nenhuma t-shirt. Também não as esperava ver no Duty-Free. 

Infelizmente, esqueci-me de tirar uma foto, acho que estava um bocado abananada. OK, eu também já estava muito emotiva por causa de estar a deixar Portugal--não eram as hormonas, como agora está na moda dizer, era mesmo deixar Portugal, logo já não estava a pensar muito bem. [Não é que eu alguma vez pense, não nos iludamos...]

Passei para a secção seguinte. Havia muitas zonas cobertas porque estavam em obras. O "food-court" estava rodeado por lojas, como se estivéssemos num centro comercial. O espaço está muito giro, mas fiquei com a ligeira sensação que aquilo não é para o português normal, é mais para pessoal de classe média e/ou alta. Acho estranho porque cada vez mais há viagens baratinhas para dar um pulinho a algum lado, logo os menos afluentes já podem viajar. Havia Desigual, Lacoste, Women's Secret, etc. Depois havia umas lojas que vendiam coisas portuguesas, uma de artesanato, outra de comida tradicional portuguesa (enchidos, enlatados, etc.), outra de lembranças, etc.

Fui à de lembranças. Encontrei as t-shirts e caiu-me o queixo. Eram muito giras, sem dúvida, mas custavam €30! Achei um bocado excessivo para o que eu queria. Pensei outra vez nesta história de eu ser uma grande procrastinadora e precisar de me emendar--tenho de trabalhar seriamente nisso. Felizmente, quem me pediu a t-shirt foi a assistente magrinha e eu acabei por comprar uma t-shirt de criança, tamanho 12, que custou €20. Juro-vos que lhe vai servir e dá uma imagem muito boa de Portugal, ao mesmo tempo que me poupa 10 aéreos...

Há menos de duas horas aterrei em Newark. A primeira loja que vi tinha t-shirts de Nova Iorque. Custavam apenas $12.99 + imposto de venda. É muito barato gostar de Nova Iorque e da América, em geral. Recomenda-se vivamente dormir com elas...







sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Lagoa de Albufeira

--Como dizia a minha mãe, "Que ventarola!"
Mais tarde, "Que ventarola, carago!", tentando imitar o sotaque do Porto. 
--"Olha, não é assim que se diz à Porto."
--"Ó pá, não me corrijas a gramática!"
--"Não! Tens de dizer 'Foda-se, que ventarola, caralho!' Assim, o teu amigo Miguel (do Porto) ficará orgulhoso de ti...




Comer sabão e deserto

Ontem passei o dia no Centro Cultural de Belém. Quem me queria ver, teve de ir lá. Enquanto eu por lá andava, não pude deixar de voltar a apreciar o edifício. Apesar de todas as críticas à sua estética, é um edifício muito bonito e interage bem com as pessoas. Este ano reparei muito nas pessoas que por lá andavam. Havia muita gente, portugueses e estrangeiros, estavam bem-dispostos, e alguns ficavam encantados quando os pulverizadores de água se ligavam no átrio principal. A luz a bater na pedra, o céu de um azul lindíssimo, rasgos de nuvens brancas--tudo isso me fez muito feliz.

Duas das pessoas que se encontraram comigo relembraram que o orçamento da construção do CCB foi atropelado por um ou dois camiões TIR e aquilo custou muito mais do que o que devia. A esse respeito tenho duas considerações a fazer. A primeira é que eu desconheço um orçamento em Portugal que tenha sido cumprido ou tenha sofrido de um enviesamento a favor dos contribuintes portugueses. Não querendo parecer eu o Bill Maher, que é um bocadito feio, apesar de muito divertido, gostaria de propor uma "nova regra": calcule-se o factor de enviesamento dos orçamentos portugueses e corrija-se futuros orçamentos com esse factor para que os orçamentos deixem de ter previsões enviesadas. Quando se sabe que as previsões são enviesadas, só por parvoíce é que continuamos a acreditar nelas.

A segunda consideração é que, no grande esquema das coisas, se todos os projectos públicos tivessem o uso que tem o CCB, os contribuintes portugueses poderiam considerar-se muito felizes. O projecto foi caro, mas as pessoas usam aquilo. Já outros projectos que por aí andam foram caros e ninguém os usa--quer dizer, eu até usei umas auto-estradas que estavam completamente vazias, mas vou dizer-vos um segredo: a minha utilidade de usar as ditas estava muito abaixo do custo das mesmas per capita e, então, do custo por utilizador, nem se fala... Eu sei que Portugal gosta de nós, mas não era preciso ter tanto trabalho e gastar tanto dinheiro para construir umas autoestradas que apenas meia dúzia de gatos pingados tem o prazer de usar. Idem para outras obras públicas de benefício duvidoso. Há, no entanto, uma solução: aumentar o número de utilizadores para, assim, aumentar os benefícios e absorver os custos. "It ain't rocket science", como se diz na América!

No terceiro piso do CCB, há um café que tem um terraço. Pensei em ir lá, mas não consegui. Quando li o menu deles ri-me tanto, tanto, que até chorei. O meu amigo F., que me telefonava a dizer que já tinha chegado, apanhou-me a meio do meu ataque de riso e pensou que eu tinha enlouquecido. Não fui eu que enlouqueci, foi alguém que na versão inglesa do menu meteu sabão e deserto em vez de sopa e sobremesa. É pena que não haja água no deserto. Assim não dá para fazer muitas bolhas com o sabão. Ou será que usamos cuspo?..

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

"O que fazer com este país" -- um surpreendente sectarismo

O meu primeiro reparo ao livro de Ricardo Paes Mamede, "O que fazer com este país". Com o tempo, escreverei uma apreciação mais longa e ponderada, mas lembrei-me desta a propósito da reportagem/entrevista do Diário Económico sobre Ricardo Reis.

No livro de Ricardo Paes Mamede, faz-me muita impressão a quantidade de trabalhos sobre a economia portuguesa que são, simplesmente, ignorados. Uma coisa é não concordar com visões diferentes, outra é fingir que não existem. 

Os trabalhos de Ricardo Reis são um exemplo desta falha. É, eventualmente, dos exemplos mais chocantes, dado que Reis é dos melhores economistas portugueses em actividade. Não se é apontado como estando na shortlist para a John Bates Clark Medal por um mero acaso. Para quem desconhece, penso que basta dizer que, no passado, este prémio antecipou os prémios Nobel de Friedman, Samuelson, Krugman, Stiglitz e, prevejo eu, Esther Duflo. Esta medalha é também conhecida como o Bebé Nobel e premeia economistas com menos de 40 anos radicados nos EUA.

Ricardo Reis, ao contrário de Sérgio Rebelo, outro dos mais prestigiados economistas portugueses, tem-se dedicado bastante ao estudo de Portugal e da crise portuguesa. Um artigo publicado no Brookings Papers on Economic Activity, em 2013, que ainda este ano dei aos meus alunos de Políticas Macroeconómicas (Mestrado de Economia) para discussão numa aula, é um bom exemplo disso.

Não me choca nada que se discorde de Ricardo Reis e que se ache que o homem está completamente errado. Mas ignorá-lo e fingir que não existe é, para mim, incompreensível e apenas pode resultar de um sectarismo que eu não esperava de Ricardo Paes Mamede.

Declaração de interesses
Há também trabalhos meus, e de co-autores meus, que considero que deviam ter sido referidos. Assim sendo, é perfeitamente legítimo interpretar esta entrada como mero ressabiamento. Disputo tal interpretação, naturalmente, mas, a bem da honestidade intelectual, fica declarado o potencial conflito de interesses.

Eu não disse?

Eu sou apolítica e apartidária, aliás, pensar em partidos, especialmente nos partidos portugueses que são de tão fraca qualidade e com os quais eu discordo em quase tudo, causa-me arrepios e alguma urticária. No entanto, não sou cega e já pensei e disse várias vezes que Pedro Passos Coelho é um homem sexy--eu ia chamar-lhe um "gajo bom", mas não quero que me processem por falta de respeito, logo fico-me pelo politicamente correcto de "homem sexy".

Depois de PPC ser eleito Primeiro Ministro de Portugal, uma das coisas que me dava mais gozo era vê-lo com os outros líderes europeus, que eu acho que são muito feios, coitados. Então ver que Portugal era representado por um homem sexy e a Alemanha era representada por uma mulher não-sexy fazia as minhas delícias. Nem os franceses tinham alguém tão sexy quanto Portugal! Portugal na bancarrota financeira; o resto da UE na bancarrota estética. A única falha que aponto a PPC é a sua presença física ser um pouco fraca. Ele devia mover-se com mais agilidade e auto-confiança.

Quando eu dizia aos meus amigos e conhecidos que PPC era um homem muito bonito, as pessoas olhavam-me de esguelha, como se eu precisasse de óculos--um dia destes até devo precisar, mas por enquanto não. Depois, quando o mundo se apaixonou pelo Varouzinho, eu pensei que quem precisava de óculos não era eu. Eu até acho que o Tsipras é um homem muito mais charmoso do que o Varouzinho alguma vez foi.

Bem, esta dissertação toda para vos dizer que não estou sozinha na minha asserção: um inquérito nos EUA concluiu que Pedro Passos Coelho é o sétimo líder mundial mais sexy.

Eu adoro a América, posso sempre contar com ela. "America, the beautiful, indeed!"

terça-feira, 11 de agosto de 2015

Sr. Director do Diário de Notícias: este leite está azedo

Nos últimos anos, têm-se sucedido os casos de corrupção envolvendo quadros de topo da administração pública. Muitos factores contribuirão para este importante progresso em termos da eficácia da justiça no combate à corrupção e certamente alguém, um dia, escreverá a sua história, uma história em que os media terão também o seu lugar.

Um dos casos de corrupção envolvendo um quadro de topo da administração pública é o do ex-director geral do Ministério da Administração Interna (MAI), o arquitecto João Correia, acusado de mais de 80 crimes, num processo com mais de uma dezena de arguidos (incluindo outros elementos da ex- Direcção Geral de Infraestruturas e Equipamentos do MAI, empresários e arquitectos). As denúncias de suspeitas de prática de actos ilícitos, que chegaram ao meu gabinete relativas àquele processo, foram imediatamente transmitidas às entidades competentes, estando na base da investigação que culminou na referida acusação.


Seria de facto muito estranho que um Secretário de Estado, com a responsabilidade das infraestruturas e equipamentos do Ministério, nas suas reuniões com o Diretor Geral das Infraestruturas e Equipamentos, não discutisse obras - o MAI tem mais de 1000 instalações operacionais. Tal absurdo poderia ser notícia. 

Como é óbvio, e ao contrário do que insinua o jornalista, eu não menti ao Ministério Público. No depoimento ao Ministério Público, em parte alguma, declaro que o referido director geral não me informava sobre obras. O que refiro no meu depoimento é que o ex-diretor geral, acusado, repito, de mais de 80 crimes, não me informou sobre algumas obras e sobre actividades inerentes às suas competências (ou outras como as que estão na origem da acusação do Ministério Público).

A acusação que o jornalista Carlos Rodrigues Lima me dirige, pondo em causa o meu bom nome, assenta em duas graves incorrecções. Primeira, toda a estória desta notícia se baseia na descontextualização de uma citação do meu depoimento, que se referia a obras específicas anteriores à minha tomada de posse e não, como o jornalista escreve, a todas as obras. Segunda, naquela citação, o jornalista alterou um determinante que altera o sentido do meu depoimento: onde o jornalista escreveu “Apesar de ter garantido ao Ministério Público que o seu director-geral "não fornecia à Secretaria de Estado quaisquer informações sobre o estado dos processos."” deveria ter escrito “sobre o estado desses processos”.

O défice nas competências de leitura e escrita deste jornalista pôs em causa o meu bom nome e reputação. 
No desempenho das minhas funções, fiz o melhor que soube e humildemente aceito eventuais críticas. O que jamais aceitarei é que ponham em causa a minha dignidade pessoal e profissional.
Informei a direcção do Diário de Notícias desta situação no dia 8 de Agosto e continuo à espera da sua resposta.

Os media são um pilar da democracia, garantindo o pluralismo de visões e contribuindo para uma discussão crítica dos problemas – uma condição necessária para o aperfeiçoamento das sociedades. A qualidade das instituições – e, portanto, da democracia e da economia – depende em grande medida do nível de exigência das sociedades. Neste processo, os media são essenciais. Por um lado, dando voz àqueles que criticam o disfuncionamento das instituições e, por outro lado, trazendo à luz situações que põem em causa o interesse público. Mas somos todos parte desse processo – como escreveu Mário de Cesariny:

Que afinal o que importa é não ter medo 
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente: 
Gerente! Este leite está azedo! 

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Olhos da Fervença

Já tenho saudades de estar sozinha e escrever. De vez em quando, talvez uma vez ao dia, pelo menos, escrevo coisas na minha cabeça, mas depois esqueço-as porque não as aponto. Também já houve posts que eu comecei, gravei e, depois, quando regressei a eles, esqueci-me da coisa que queria escrever. Esta falta de disciplina criativa é um dos meus pontos fracos. Vou tentar emendar-me e escrever este antes que se varra da minha cabeça.

No Sábado fui à Praia da Tocha. Apesar de ter lá ido muitas vezes quando eu vivia em Portugal, não conseguia lembrar-me dessa praia. É estranho porque eu fui mais vezes à Tocha do que a Mira, mas Mira tem uma presença muito mais clara na minha cabeça. Fui lá, não por iniciativa minha, mas porque uma amiga que eu queria ver estava lá a acampar, logo fui ter com ela. Entretanto, uma outra amiga, a F., veio de Lisboa para Coimbra e eu também a queria ver, mas o meu tempo em Coimbra já estava muito limitado. Quando eu disse à F. que ia à Tocha, ela e a irmã também quiseram lá ir.

Estava um vento bestial e o mar estava bravo--uma ocorrência normal na Tocha; fazer praia estava fora de questão. Almoçámos num restaurante que tinha uma sala de jantar com um lado em vidro que tinha vista para o mar. Esse enquadramento é um dos meus preferidos: estar num sítio protegido a comer algo confortante e a ver o mar muito bravo é uma das imagens mentais que eu uso para me descontrair. Talvez tenha algum significado subliminal, que nos sugira que mesmo no meio de uma tempestade é possível encontrar um abrigo e sentirmo-nos bem, mas para mim tem também a ver com uma tarde da minha infância em que isso aconteceu. Nesse dia eu senti-me bem e protegida. Décadas mais tarde a imagem dessa experiência começou a aparecer no meu consciente frequentemente.

Depois do almoço e do café, saímos da Tocha. Pelo caminho, um dos meus amigos sugeriu ir a Olhos da Fervença, uma comunidade com uma praia fluvial, na freguesia de Cadima, situada no concelho de Cantanhede. Depois de navegarmos um labirinto de ruas com a ajuda da app de mapas do Google, chegámos ao nosso destino, que estava completamente cheio de pessoas. Eu teria gostado muito mais de ter visitado aquele local numa altura em que não estivesse lá quase ninguém, mas foi também engraçado ver que muita gente conhecia um sítio do qual eu nunca tinha ouvido falar.

Passeámos ao longo da praia fluvial e tentámos compreender de onde vinha a água. Especulámos que seria de um riacho que corria ao lado. Uma parte do parque estava vedado ao acesso de pessoas com uma rede, no interior da qual havia um sistema de tratamento de água à margem da ribeira. Numa parte da praia, duas redes colocadas de um lado ao outro da água apanhavam limos. Pensei que talvez fosse um sistema de filtração da água. A minha cabeça fervia de perguntas de como aquele sítio tinha surgido e funcionava. Durante o meu doutoramento, tive uma cadeira de engenharia de biossistemas, na qual estudei aquíferos, logo tenho alguns conhecimentos rudimentares do tema e muita curiosidade acerca recursos hídricos.

Reparei que dentro da vedação estava um senhor que tomava conta do sítio. Perguntei-lhe como é que aquilo funcionava. Ele prontamente se ofereceu para nos dar uma visita guiada da área vedada. A água vem de uma nascente; a parte vedada do lago tem areias movediças onde a água brota do solo. Achei fascinante. Nunca pensei que haveria areias movediças em Portugal; areias movediças eram, na minha cabeça, associadas com os filmes do Sandokan que passavam na televisão quando eu era miúda. A maior parte da água que brota é usada para abastecer a parte norte de Coimbra. O que resta vai para a praia fluvial e também corre num pequeno riacho. Em alguns sítios da nascente, a água é projectada com tanta força do solo que colunas de cimento são usadas como lacres.


Neste vídeo que fiz podem ver a parte da nascente com areias movediças.

O guarda da Central foi muito simpático e prestável. Disse que, se pudesse, mostrar-nos-ia a casa das máquinas que fazem a circulação e o tratamento da água, mas tal não era permitido. Queixou-se também da falta de civismo de algumas pessoas que visitam a praia fluvial. Na semana passada, uma senhora desobedeceu-o e lavou o cão com champô na praia. À noite, tiveram de aumentar o fluxo de água da praia para diluir os efeitos do champô e de potenciais patógenos provenientes do cão. Seria bom que pessoas que se comportassem assim fossem responsáveis pelo custo dos danos que causam. Porque não multá-las por pôr em risco a saúde pública?

Noutro episódio mais antigo, uma rapariga desobedeceu ao nadador salva-vida e fez mergulhos com piruetas na praia, que tem pouca profundidade, talvez chegue à cintura de um adulto de altura média. O seu último mergulho, dado enquanto o seu namorado refilava com o salva-vida, não correu bem e ela foi levada para o hospital com uma fractura. É possível que tenha ficado paraplégica.

No final da nossa visita com o guarda, ele recitou-nos algumas quadras de António Aleixo e mencionou os episódios que as inspiraram. Toda esta experiência foi completamente inesperada, mas muito gratificante.

Nota: A Universidade de Lisboa implementou um projecto de recolha de informação de fontes e nascentes portuguesas, que foi financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia. O projecto foi uma colaboração do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e do Centro de Estudos de Antropologia Social. "O Novo Aquilégio" é uma página de Internet onde se disponibiliza a informação do projecto. Lá encontram alguns dados acerca de Olhos da Fervença.

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Rituais

Estou no restaurante Paço do Conde, que é uma instituição em Coimbra, com amigos. Está cheio de turistas. Um casal passou a noite inteira a tirar fotos um do outro com o telemóvel. Algumas das fotos eram tiradas a pouquíssimos centímetros da cara e só apanhavam uma bochecha ou um olho. Será que isto é um novo ritual na arte da sedução? Nas palavras dos REM: "It's the end of the world as we know it..."

Gente difícil de contentar

Eu não percebo. A malta queixa-se que as campanhas eleitorais são feitas de mentiras e de acusações entre os partidos. Ora, há finalmente um partido que assume, em cartazes espalhados pelo país, que deixou o país com problemas (ao nível do emprego, pelo menos). E o que lhe acontece?! É saudado pela honestidade? Não!, é alvo de chacota. Este país é mesmo difícil de contentar.

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Quando a taxa de desemprego bateu à porta dos 18%, se me dissessem que em 2015 a taxa de desemprego iria baixar para 13-14% e que o emprego estava a recuperar teria considerado que eram previsões optimistas.
Não percebo nada de campanhas eleitorais. Nunca ganhei nem perdi nenhuma. Mas parece-me que mais valia o PS não negar a melhoria do mercado de trabalho e, em vez disso, lembrar que as principais críticas que se fizeram ao seu cenário macroeconómico eram de que as suas previsões eram demasiado optimistas. Afinal parece que não são, o que até dá alguma folga adicional a um governo PS para cumprir o seu programa.

PS E preparem-se, com mais gente a trabalhar o PIB vai crescer um pouco mais.

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Boas notícias!

É Quarta-feira e ontem descobri que o Tumblr de Uma Casa em Tróia está novamente activo. A campanha de natalidade está em grande forma--não deixem que a praia vos impeça. Por falar nisso, estava a apetecer-me ir a uma praia naturista. 

Os queridos...

Nuno, Luís, Zé Carlos

Manuel, Fernando

terça-feira, 4 de agosto de 2015

É pá, está bem, mas...





Acho bem que o estigma desapareça. Mas se um dos objectivos era mesmo o de mostrar que a gordura é formosura então..., lamento, fracassou rotundamente.

TSUs

A minha primeira reacção quando soube que a descida da TSU dos trabalhadores proposta pelo PS não iria afectar a Função Pública foi achar uma estupidez. Depois de uma transição de vários anos, promovida por governos do PS, para que funcionários públicos e trabalhadores do sector privado ficassem com regimes de segurança social idênticos tinha de vir um governo do PS reintroduzir diferenças nos dois regimes. Uma parvoíce.

A minha segunda reacção foi exactamente esta do João Miranda: O Gaspar era um amador.

PS Do ponto de vista puramente contabilístico, Miranda não tem razão. Mas do ponto de vista económico-financeiro não encontro nenhum erro de raciocínio. João Miranda só não terá razão, se como consequência da não descida da TSU, os trabalhadores da Função Pública ficarem com pensões mais elevadas no futuro. Nesse caso, não se tratará de uma redução da despesa pública, mas apenas uma transferência intertemporal de despesa. 

PPS Será que dá para fazer o mesmo truque para reduzir pensões? Em nome da sustentabilidade da Segurança Social, pôr as pensões a pagar TSU?

Voltas...

Tenho andado a (re)descobrir Portugal. Há sítios onde fui que nunca tinha visitado; há sítios onde vou repetidamente, mas onde tento suspender o meu à-vontade, para que eu os possa ver como se os visse pela primeira vez. Por vezes, a familiaridade com um local leva-nos a ignorá-lo; mas essa familiaridade também pode permitir-nos ignorar o que todos vêem, para que nos possamos focar naquilo em que poucos reparam. Eu tento cultivar esta última atitude. Até agora, já visitei estes sítios:
  • Azenhas do Mar: saí do aeroporto e fui imediatamente para aqui.
  • Carcavelos: uma das minhas amigas que vive em Londres veio a Portugal e coordenámos as nossas visitas para que nos pudéssemos encontrar. Já no ano passado fizemos o mesmo.
  • Tavira: o Algarve não é um sítio que eu conheça bem, mas a sorte levou-me lá desta vez e eu não pude recusar ir colmatar a minha ignorância. Enquanto lá, visitei as seguintes praias: Cacela Velha, Barril, e Manta Rota. Tive também oportunidade de ir a Cabanas de Tavira.
  • Grândola: no regresso de Tavira parei em Grândola para almoçar. Nunca lá tinha ido.
  • Coimbra: eu e Coimbra temos uma relação de amor/ódio--amo a cidade, odeio o que lhe estão a fazer.
  • Montemor-o-Velho: os campos de arroz, o castelo, queijadas de Tentúgal mesmo ao lado, bolos de Ançã...
  • Figueira da Foz: é como visitar os verões da minha infância.
  • Lousã: quem não gosta do sítio que é o enquadramento da lenda da Princesa Peralta?
  • Viseu: uma visita rápida para ir visitar um poeta e uma melhor amiga.
  • Serra da Estrela: um regresso à infância e descobri que já não enjoo a subir a montanha de carro. As cores das vegetação são de cortar a respiração. Muitas vezes desejo estar com um amigo meu que estuda ecossistemas, só para que ele me mostre todas as coisas que ele vê e que me escapam. Esta foi uma dessas vezes.
  • Covilhã: visitei a UBI, conheci pessoas, e até trabalhei um bocadinho num dos gabinetes, pois tinha umas coisas para fazer para o meu emprego.
  • Fundão: não são só as cerejas que estão ao rubro, o Fundão também está. Tive um jantar muito giro n'O Alambique.
  • Porto: eu amo o Porto. Passear pela Av. da Boavista e ouvir gaivotas, ir tomar chá quente ao Praia da Luz à noite e olhar para o mar, comprar livros na Lello, sentir o coração a palpitar ao pé do edifício do Centro Português de Fotografia (antigo Tribunal da Relação do Porto), dar abraços a amigos que me fazem rir tanto...
  • Leça da Palmeira: eu não conhecia, mas fiquei feliz por não só ver Leça, como também por conhecer as palavras de António Nobre.
  • Guimarães: a primeira vez que fui a Guimarães foi numa visita de estudo, eu devia ter sete anos. Guimarães é muito especial, está a ser bem administrada e nota-se, quando se anda pela cidade, que há uma linha lógica que guia a forma como a cidade é gerida. Desejei que Coimbra fosse gerida assim...
  • Apúlia: professo a minha ignorância acerca deste sítio. Eu não conhecia nem sequer o nome, os meus amigos tiveram de corrigir-me várias vezes até eu acertar com o nome. Lá, visitei um evento gastronómico na Colónia de Férias da Apúlia, ouvi histórias das crianças que choram quando têm de regressar a sua casa porque na colónia encontram amor e alegria e têm oportunidade de ser verdadeiramente crianças. Senti uma mistura de felicidade e tristeza: felicidade por existirem lugares e pessoas que dêem estas experiências a crianças; tristeza por os pais não poderem proporcionar o mesmo. Tomei café com uma colega da faculdade.
  • Braga: dei lá um pulinho para um jantar in promptu muito especial com pessoas muito giras. Os portugueses sabem mesmo divertir-se à mesa. Desejei poder levar estas pessoas na minha bagagem para poder ter jantares com esta companhia todos os dias.
Depois de mais de 2.000 Km ainda não cheguei ao fim, mas já dava para ter ido até Bruxelas de carro...